Lei da Nacionalidade em 2025: o que caiu, o que fica de pé e como isso afeta o seu pedido?
Lei da Nacionalidade em 2025: o que caiu, o que fica de pé e como isso afeta o seu pedido?
O retrato da Lei da Nacionalidade em 2025 é o de uma reforma avançada, mas ainda incompleta: várias mudanças estruturais já estão aprovadas, outras foram travadas por inconstitucionalidade e, no meio disso, os imigrantes vivem um período de grande incerteza, mas também de decisão estratégica.
O ponto de partida: o que é que está a ser reformado
A Lei da Nacionalidade continua a ser, formalmente, a Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, sucessivamente alterada ao longo de mais de quatro décadas. Nos últimos anos, porém, a pressão migratória, a necessidade de redefinição de alguns regimes específicos (como o dos descendentes de judeus sefarditas) e o debate político sobre “exigência” e “integração” transformaram esta lei num terreno central de disputa.
A revisão que está em causa em 2025 resulta de um decreto aprovado pela Assembleia da República (o Decreto n.º 17/XVII), enviado ao Presidente da República para promulgação, e sujeito a fiscalização preventiva de constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional, a pedido de 50 deputados. O Tribunal respondeu através do Acórdão n.º 1133/2025, que não chumbou toda a reforma, mas declarou inconstitucionais normas específicas, obrigando o Governo e o Parlamento a corrigir apenas esses pontos.

O que realmente muda na prática para o imigrante
Mesmo depois da intervenção do Tribunal Constitucional, a direção de fundo da reforma mantém-se: mais anos de residência exigidos, menos vias para chegar à nacionalidade e maior ênfase numa relação prolongada e formal com o território e cultura portuguesa.
Entre as mudanças aprovadas que afetam diretamente o público leigo, destacam‑se:
- Aumento do tempo de residência para naturalização:
- Cidadãos da CPLP passam de 5 para 7 anos de residência com título de residência.
- Os restantes estrangeiros passam de 5 para 10 anos de residência com título de residência.
Isto significa que o acesso por via do tempo de residência deixa de ser uma meta de médio prazo para muitos imigrantes e torna‑se, na prática, um projeto de longa duração. - Há que considerar que a possibilidade do pedido de título permanente de residência após 5 anos de residência legal (habilidade de comunicação em português é exigida) ou contínuas renovações dos títulos temporários de residência por períodos sucessivos de 3 anos permanecem em vigor e sem alterações.
- Reconfiguração da nacionalidade pelo nascimento em Portugal (ius soli):
- Deixa de ser possível, na prática, usar o nascimento de um bebé em Portugal como fundamento para que os pais possam requerer a nacionalidade.
- Passa a exigir‑se, para o próprio bebé ter direito à nacionalidade, que os pais tenham, em regra, cinco anos de residência com título, contínuos e formalmente reconhecidos.
É preciso garantir uma residência estável e documentada ao longo de vários anos.
- Fim do regime especial dos descendentes de judeus sefarditas:
- Este regime permitia, até aqui, acesso à nacionalidade com base em provas de origem sefardita e ligação a comunidades judaicas históricas.
- A reforma encerra esta porta, retirando uma das vias mais utilizadas por luso‑descendentes no Brasil e noutros países.
- Recuo numa das maiores “vantagens” recentes:
- A lei em vigor permitia contar, para o cálculo dos anos de residência, o tempo de espera entre o pedido de autorização de residência e a emissão efetiva do título.
- A reforma revoga expressamente essa regra, passando a contar apenas o período em que já existe título de residência válido.
Para quem acompanha o tema de forma técnica, isto é uma alteração silenciosa mas profunda: muitos imigrantes perdem meses ou anos que, até agora, eram determinantes para atingir mais cedo o limiar dos 5 anos.
O que não muda (e porquê isso é importante)
Apesar da retórica política de endurecimento, alguns pilares fundamentais do regime de nacionalidade permanecem, e isso é crucial para transmitir segurança ao público leigo:
- Continua a existir um “direito” à nacionalidade para quem cumpre os requisitos legais:
A naturalização não é apresentada apenas como um favor discricionário do Estado, mas como uma via jurídica estruturada. A discussão no Tribunal Constitucional reforça precisamente a ideia de que o acesso à cidadania é um direito fundamental, sujeito a garantias constitucionais, e não uma mera concessão graciosa. - Mantém‑se a impossibilidade de perda arbitrária da nacionalidade:
O Tribunal rejeitou as tentativas mais agressivas de ligar determinadas condenações criminais à perda de nacionalidade como pena acessória. Ao fazê‑lo, reiterou princípios como a proibição de efeitos automáticos das penas, o caráter pessoal da responsabilidade e a proteção contra apatridia. Assim, o cidadão naturalizado continua a ter uma proteção robusta contra retiradas “punitivas” da sua cidadania. - Persistem vias clássicas como filiação, casamento/união de facto e ascendência direta:
A reforma centra‑se sobretudo nos requisitos de residência e em regimes especiais, não abolindo as bases de atribuição por filiação, nem o acesso por casamento ou união de facto com cidadão português (embora, noutros momentos legislativos, estes critérios já tenham sido endurecidos).

O que foi considerado inconstitucional (e o que isso revela)
O Acórdão n.º 1133/2025 funciona quase como uma aula de direito constitucional aplicada à nacionalidade. De forma simplificada, o Tribunal detectou inconstitucionalidades em normas que:
- Tornavam a perda ou a recusa de nacionalidade uma consequência quase automática de certas condenações criminais:
A introdução de um limiar de pena de prisão de 2 anos como bloqueio automático à naturalização, e a previsão de perda de nacionalidade como pena acessória, foram consideradas excessivas e desproporcionadas. Faltava ponderação individual de cada caso, o que violava princípios como a proporcionalidade e o caráter pessoal da culpa. - Assentavam em conceitos vagos e indeterminados:
A norma que permitia recusar a nacionalidade com base em “comportamentos que, de forma concludente e ostensiva, rejeitem a adesão à comunidade nacional, às suas instituições e símbolos” foi vista como demasiado aberta, dando ao Estado um poder subjetivo perigoso para excluir candidatos. - Fragilizavam a segurança jurídica e a proteção da confiança:
A tentativa de impedir a consolidação da nacionalidade em situações de “manifesta fraude”, sem um enquadramento suficientemente preciso, e a ideia de que o pedido de nacionalidade só poderia ser apresentado quando todos os requisitos estivessem integralmente preenchidos, levantaram problemas de retroatividade restritiva de direitos e de quebra de expectativas legítimas de quem confiou num determinado quadro legal.
Ao declarar estas normas inconstitucionais, o Tribunal enviou uma mensagem clara: a lei pode ser mais exigente, mas não pode ser arbitrária, retroativa em prejuízo de quem já está integrado, nem transformar a nacionalidade num instrumento de punição.
Os próximos passos institucionais e o que isso significa para o dia a dia
Do ponto de vista formal, o que acontece agora é relativamente técnico, mas com consequências muito concretas:
- O Governo não tem de reescrever toda a lei.
Apenas os artigos ou segmentos declarados inconstitucionais terão de ser reformulados. Isso reduz o tempo político necessário para uma nova votação parlamentar e acelera o calendário de entrada em vigor. - O Parlamento terá de reapreciar apenas esses pontos.
Em termos práticos, isso cria um “tempo de suspensão”: a reforma está aprovada em grande parte, mas não pode ser promulgada tal como está. Durante este intervalo, continuam em vigor as regras atuais, mais favoráveis em vários aspetos (prazos menores, possibilidade de contar o tempo de espera pelo título, etc.). - As pausas políticas criam uma janela de oportunidade para o imigrante.
Entre o recesso parlamentar de fim de ano, o regresso em janeiro e a interrupção adicional ligada às eleições presidenciais, é expectável um atraso na aprovação da versão corrigida da lei e, por arrasto, na sua entrada em vigor. Para quem está prestes a completar 5 anos de residência, ou para famílias em que vão nascer crianças em Portugal, esse intervalo pode ser decisivo para apresentar pedidos sob o regime ainda vigente.
A nacionalidade portuguesa continua a ser um direito juridicamente protegido, mas cuja “porta de entrada” está a ficar mais estreita e mais distante no tempo. A decisão do Tribunal Constitucional atuou como travão a alguns excessos, mas não inverteu a orientação política geral: mais exigência, mais tempo de residência, menos atalhos.
Conclusão:
O ano de 2025 e os primeiros momentos de 2026 são decisivos para o pedido de nacionalidade. A análise individualizada de cada caso, revisão urgente da elegibilidade (por anos de residência, nascimento de filhos em Portugal, casamento/união de facto com português, etc.) devem ser feitos por advogado com expertise na área para o planeamento da apresentação dos edidos antes da viragem definitiva do regime legal.
Última atualização: 17 de Dezembro de 2025.